Ampla Edição 55

O Vigitel também registrou crescimento considerável de excesso de peso. Mais da metade dos brasileiros, 55,7%, tem excesso de peso, considerado o estágio inicial para o quadro de obesidade. Um aumento de 30,8% quando comparado com percentual de 42,6% no ano de 2006. O aumento da pre- valência foi maior entre as faixas etárias de 18 a 24 anos, com 55,7%. Quando verificado o sexo, os homens apresentam crescimento de 21,7% e as mulheres 40%. Na década de 1970, no Brasil, apenas 18% dos homens e 28% das mulheres esta- vam acima do peso. Está claro que o desafio do país mudou. Se há 40 anos a preocupa- ção era com a desnutrição, hoje é a obesida- de que mais ameaça a saúde dos brasileiros. Uma das explicações dadas pelos pesqui- sadores remete ao fato do êxodo rural. O país tinha consideravelmente mais pessoas trabalhando na roça, queimando calorias, do que hoje, que tem mais gente nas cidades, com empregos que exigem pouco esforço físico. Além disso, não há mais espaço para crianças brincarem na rua, porque as cidades cresceram muito, e isso possibilita as ativi- dades digitais com pouca exigência física. CAPA 16 AMPLA OUT/NOV/DEZ 2019 A Imagem psicológica Além do sedentarismo, existem outros fatores que contri- buem para a obesidade. Fatores psicológicos, como a ansie- dade, fatores genéticos, pois filhos de pais obesos apresentam uma predisposição de também serem obesos e fatores culturais, como é o caso do consumo exagerado dos fast foods, comum nos dias atuais, especialmente, nas médias e grandes cidades. A psicóloga analítica Gisele Accioly lembra que vários aspectos psicológicos inconscientes podem contribuir para o quadro de obesidade. Um deles, segundo ela, é o confronto com as questões existenciais. “Isso pode gerar em nós uma ânsia enorme para encontrar respostas essenciais da vida. E até que essa dinâmica se desenvolva, as angústias por trás dessas bus- cas, como a não-pertencimento, por exemplo, pode causar an- siedade, dificultando o processo individual de escolha e, por sua vez gerando ainda mais ansiedade. Num círculo vicioso”, conta. A frustração também gera ansiedade. “Um exemplo é quando o indivíduo enfrenta alguma dificuldade na realização que está buscando, ou ainda quando se depara com o vazio existencial formado pela falta de manifestação pessoal autên- tica. Ou quando enfrenta qualquer outro obstáculo com o qual não consegue lidar e perde o prazer de simplesmente estar vivo. Ou, ainda, quando o indivíduo não canaliza de forma autêntica sua energia criadora, perdendo a capacidade de perceber-se no mundo de maneira construtiva”, explica Gisele. Para a psicóloga, “essas são algumas maneiras desse ‘va- zio interno’ ir aumentando de tal forma que se transforma em gatilho gerador de compulsões, levando a pessoa a preencher esse ‘buraco’ com algo externo, seja com o jogo, com a bebida, com a comida, com as drogas ou com o sexo. Numa tentativa de solucionar os conflitos internos”, alerta. Gisele explica que o alimento está associado a carinho, a interrupção de um desconforto, a acolhimento. Isso desde a pri- meira mamada de um bebê. “Por isso, os distúrbios alimentares apresentam bases psicológicas que denotam conflitos afetivos associados à busca por alguma coisa. A imagem da nutrição, na Mitologia Grega, está relacionada à Deméter, a grande mãe, a deusa responsável pelas colheitas fartas, que nutria os seres para que eles se sentissem saciados”, relembra. Nesse sentido, “essa imagem psíquica de que a grande mãe nos alimenta o tempo todo, se não está bem trabalhada em nós, pode levar a uma patologia dessa saciedade, a compulsão alimentar. Essa compulsão tem por objetivo “buscar manter o indivíduo sempre num estado de proteção permanente, para que ele não sinta a falta, que é justamente o que nos mobiliza a algo. É uma forma de fuga, porque sentir a falta me leva a procurar, me obriga a procurar. E pode exigir atitudes. Ao pas- so que, se eu não sinto falta, eu não preciso ir em busca. Mes- mo que eu fique estagnado e desconectado das minhas reais necessidades, fica essa falsa ideia de que está tudo resolvido. Quando não está”, explica. Por isso, a importância de buscar ajuda quando as coisas na nossa vida não estão funcionando demaneira adequada. A “não funcionalidade” acaba sendo o alerta máximo. Ele já é sintoma. Portanto, olhar-se com carinho, cuidar-se e perceber quando as coisas não estão como desejamos pode ser o primeiro passo para a nossa cura. Inclusive, quando se tratar de obesidade.

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