Revista Ampla 66

26 AMPLA JUL / AGO / SET 2022 ENTREVISTA QUESTÕES LEGAIS NA SAÚDE Revista Ampla – O senhor poderia apresentar um panorama sobre o rol taxativo e exemplificativo relacionado aos planos de saúde? João Pedro Gebran Neto - É importante destacar a relevância do debate sobre o rol da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), seja em face da insegurança jurídica que o tema apresentava, vez que parte da jurisprudência dizia ser taxativo e outra parte exemplificativo, seja pela importância para os usuários dos planos de saúde. O mais curioso é que tanto as decisões judiciais que adotavam uma solução, quanto as que defendiam solução oposta, fundavam-se na defesa do usuário, divergindo se a perspectiva era coletiva ou individual, respectivamente. Sempre tive a compreensão de que a existência de um rol de atendimento mínimo imposto às operadoras de planos de saúde consiste numa defesa dos consumidores, vez que nenhum contrato pode ofertar menos do que está relacionado pela ANS. Essa garantia é fundamental aos consumidores, pois evita a oferta ao mercado de planos despidos de conteúdo concreto, com atendimentos pífios, ou apenas de previsão de custeio de itens simples e baratos, deixando o consumidor desabrigado nas situações realmente importantes. De outro lado, também é uma garantia reguladora do sistema de concorrência, porque todas as operadoras vão ser obrigadas a prestar, minimamente, os mesmos serviços, sendo possível a contratação de serviços adicionais. Essa regulação equaliza os produtos, permitindo maior concorrência entre os diferentes planos, com disputa de mercado e a consequente redução de valores. É nesse cenário que se debate sobre esse rol ser taxativo ou enumerativo, sendo certo que o Superior Tribunal de Justiça (STJ) deu relevante passo em direção ao reconhecimento da taxatividade, ainda que preveja uma cláusula de abertura para situações excepcionais. A questão ainda não está definitivamente decidida, cabendo recursos internos no STJ, bem como uma previsão de julgamento do tema pelo Supremo Tribunal Federal (STF). Também o Congresso Nacional está discutindo o tema, tendo sido aprovada na Câmara de Deputados um projeto de lei (PL 2033/22) que impõe à ANS revisar o rol sempre que houver aprovação de novas tecnologias pela ANVISA, fixando condições. *O projeto de lei ainda precisa ser apreciado pelo Senado Federal. Revista Ampla – Essa questão vem sendo, principalmente, abordada na perspectiva dos planos de saúde, porém há implicações no Sistema Único de Saúde? João Pedro Gebran Neto - A discussão sobre a taxatividade do rol de cobertura da saúde suplementar traz reflexos sobre o SUS, principalmente na perspectiva da judicialização da saúde. Se determinada pretensão do consumidor/paciente não for objeto de cobertura pelo plano, muito provável que ela se volte ao SUS, buscando na saúde pública aquilo que não obteve junto à saúde suplementar. Essa me parece uma característica da judicialização da saúde, porque todas as pretensões do paciente, a partir da orientação médica, sempre que não cobertas pelo plano de saúde ou não prevista na política pública de saúde, têm sido objeto de demandas judiciais. Em recente manifestação, o Ministro da Saúde MarceloQueiroga, indicou que a judicialização contra a União, para atender cerca de 6 mil usuários do SUS, já ultrapassa o montante anual de R$ 2 bilhões, valor próximo de todo o dispêndio anual com as farmácias populares, cuja cobertura é para os mais de 200 milhões de brasileiros. Sobre essa perspectiva, parece que o foco precisa se voltar sobre a construção de políticas públicas e regramentos adequados, tanto para a saúde pública quanto para a saúde suplementar, como a discussão de o que incorporar, qual o tempo de duração do processo de incorporação, qual a capacidade do Estado para arcar com novas tecnologias, discussão sobre elevados graus de evidências científicas, dentre outros temas. E, esses pontos, para mim, deveriam passar ao largo da chamada judicialização da saúde, porque estão ligados às políticas públicas e os debates técnicos. Revista Ampla - O senhor acredita que diante desse cenário, e entendendo as mudanças e transições da sociedade, será necessária uma revisão e até atualização do rol taxativo pela ANS de forma mais frequente? João Pedro Gebran Neto - O rol é uma garantia do consumidor e das operadoras de planos de saúde, permitindo higidez e previsibilidade ao sistema. Um rol aberto certamente traria muito mais problemas que vantagens para ambas as partes, podendo, inclusive, retirar da proteção da saúde suplementar muitas pessoas, dada inexorável elevação de custos, decorrente do aumento dos riscos imprevisíveis para as operadoras. A convite da Revista Ampla Unimed Paraná, o desembargador do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, João Pedro Gebran Neto, apresenta o contexto das decisões judiciais sobre a temática do rol taxativo e exemplificativo na perspectiva dos planos de saúde e dos usuários. Reflexões sobre os debates levantados pela Agência Nacional de Saúde (ANS) envolvendo o rol taxativo e exemplificativo GIORGIA GSCHWENDTNER

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