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Quando tomamos uma decisão médica podemos ter dificuldade de aceitar que, independente da qualidade de nossa decisão, não temos certeza absoluta de quais serão os resultados. Muitos podem se utilizar desse fato para justificar o imobilismo, os maus resultados, ou até mesmo a impotência. Outros, mais cartesianos, simplificam: “a chance é de 50%, pode dar certo ou errado”. Ao considerarmos a evidência a partir da pesquisa clínica, na prática diária, há vários fatores de confusão, gerando incerteza nos resultados: o ambiente de pesquisa não pode ser reproduzido, seja pela população diferente do dia a dia, com todas as associações e comorbidades, seja porque as intervenções não contam com a estrutura, recursos humanos e protocolos utilizados, ou seja porque os desfechos considerados, geralmente de benefício, não correspondem às expectativas da relação médico-paciente. Além disso, usualmente a força da evidência é insuficiente para estabelecer, com baixo nível de incerteza, o nexo causal entre os procedimentos testados e os efeitos. Algo mais difícil de explicar ainda é a incerteza inerente à própria expressão dos resultados da pesquisa. Quando expressos, em média refletem um número com variação, representativa para uma população mas, que não podem ser aplicados ao paciente individual. Quando expressos em números absolutos, estima-se a probabilidade de um paciente experimentar o benefício ou o dano, mas nunca saberemos se o nosso paciente estará entre os que terão o efeito. O princípio da incerteza pode ser definido como “o conjunto de inúmeros fatores que determinam em nossas ações médicas, um conjunto de resultados prováveis, mas não certos. Apropriados, mas não perfeitos. Esperados, mas não garantidos. Desejados, mas nem sempre obtidos”. Lidamos com esses fatores todo o tempo, mas pergunto: A sociedade e o sistema de saúde os reconhecem? São considerados com parcimônia quando as coisas não vão bem? Estão presentes nas auditorias, na gestão e na regulação? Fazem parte das diretrizes ou protocolos? Nós os reconhecemos e os consideramos? Como lidar com a incerteza sem ficarmos imóveis? Como considerá-la em nossas ações? Qual o valor de estimá-la? Como podemos minimizá-la? No atendimento a seu paciente, o médico procura sempre tomar alguma decisão, que pode ir desde a observação até procedimentos mais invasivos. Mas é necessário considerar no paciente individual, qual o nível de incerteza pode ser tolerado, seja em decorrência do nível de gravidade ou urgência, ou seja relacionado ao tipo de dúvida clínica envolvida e sua possível força de evidência correspondente. Conhecer o tamanho da incerteza permite também definir prioridades e estratégias, ser claro com o paciente, além de lidar melhor com os resultados. Assim, se esperamos reduzir o risco de morte em 20%, aumentando a sobrevida de 10 meses para 12 meses, isso significa que, como médicos, esperamos beneficiar 1 paciente a cada 5 tratados, e como sistema, se cuidamos de 200 pacientes ano, beneficiaremos 40 pacientes ano, e teremos 80 meses a mais de sobrevida estimada. Poderemos na decisão, incluir os danos esperados, os custos e outras prioridades, frente a resultados melhores. Para reduzirmos a incerteza, devemos aprender a traduzir o conteúdo e os resultados da pesquisa “forte” para a prática: considerando se a população do estudo é semelhante ao nosso paciente; estando certos de que os novos tratamentos e métodos diagnósticos foram devidamente comparados com os procedimentos já em uso; aprendendo a balancear benefício e dano e finalmente, levando em consideração os desfechos que importam. Ser incerto não é uma opção, é uma certeza da vida médica. Mas tomar decisões, sem considerar, compreender, estimar e comunicar a incerteza, é um erro que além de aumentar a incerteza, piora os resultados.
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